O Primeiro Carro do Espírito Santo

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A história do automobilismo no Espírito Santo começou em uma manhã ensolarada de 1908, quando o comerciante João Rodrigues Pereira desembarcou no Porto de Vitória com uma verdadeira preciosidade: um Renault Type AG importado diretamente da França. O evento, que hoje pode parecer corriqueiro, representou um marco na modernização do estado e o início de uma nova era para a sociedade capixaba.


As ruas de paralelepípedos da capital, até então dominadas por carroças e bondes puxados por burros, testemunharam a chegada do primeiro automóvel. O barulho do motor ecoava pelas ruas estreitas do Centro de Vitória, atraindo uma multidão curiosa que se aglomerava para ver aquela “máquina moderna” em movimento. Muitos moradores relataram ter caminhado quilômetros apenas para ter um vislumbre do veículo.


O Renault Type AG era um veículo notável para sua época. Equipado com um motor de 2 cilindros e 8 cavalos de potência, apresentava uma carroceria aberta em madeira e metal, rodas com aros de madeira e pneus de borracha maciça. A cor original, um vermelho vibrante, contrastava com a paisagem colonial da cidade, tornando-o ainda mais impressionante aos olhos dos habitantes locais.


João Rodrigues Pereira, um visionário comerciante do setor cafeeiro, não imaginava que sua aquisição revolucionaria o transporte no estado. O carro não era apenas um meio de locomoção, mas um símbolo de status e progresso. Sua chegada inspirou outros empresários e fazendeiros abastados a importarem seus próprios veículos, dando início a uma verdadeira revolução nos transportes capixabas.


Os primeiros meses foram marcados por desafios únicos. A falta de estradas adequadas e de combustível eram problemas constantes. O próprio João Rodrigues precisou importar gasolina em barris e armazená-la em sua propriedade. Mecânicos? Não existiam. O proprietário contava com a ajuda de um funcionário francês da Renault, que permaneceu no estado por seis meses para ensinar os básicos da manutenção do veículo.


A presença do automóvel também gerou mudanças significativas na legislação local. Em 1909, a prefeitura de Vitória publicou o primeiro conjunto de regras para o tráfego de automóveis na cidade, estabelecendo limites de velocidade (15 km/h) e horários permitidos para circulação. O documento original, preservado no Arquivo Público Estadual, é um testemunho fascinante desse período de transição.


O impacto cultural foi igualmente profundo. Os jornais da época dedicavam páginas inteiras para descrever o “moderno meio de transporte”. Surgiram novas palavras no vocabulário local: chauffeur, gasoline, pneu. As famílias tradicionais começaram a incluir “passeios de automóvel” em suas atividades de lazer dominical, uma prática que se tornaria tradicional nas décadas seguintes.